domingo, 14 de março de 2010

    OLHARES, olhando o mar .



    Sempre que fito o mar
    tenho a ilusão de achar-me diante
    de um silêncio amplo, ondulante,
    de um silêncio profundo,
    onde vozes lutassem por gritar,
    por lhe fugirem do invisível fundo.


    Diante do mar eu fico triste,
    nessa mudez de quem assiste
    reproduções do próprio dissabor;
    diante do mar eu sou um mar,
    a outro de apor
    e a se indeterminar.


    O mar é sempre monotonia,
    na calmaria
    ou na tempestade.
    Fujo de ti, ó mar que estrondas!
    porque a tristeza que me invade
    tem a continuidade
    das tuas ondas...


    Mas te amo, ó mar, porque minha alma e a tua
    são bem iguais: ambas profundamente
    sensíveis, e amplas, e espelhantes;
    nelas o ambiente
    atua
    apenas superficialmente...


    Calma de cismas, de êxtases, de sonhos,
    desesperos medonhos,
    ânsias de azul, de alturas...
    - Longos ou rápidos instantes
    em que me transfiguro, em que te transfiguras...
    Nos nossos sentimentos sem represa,
    nas nossas almas, quanta afinidade!
    - Tu sentindo por toda a natureza!
    - Eu sentindo por toda a humanidade!


    Nos dias muito azuis, o meu olhar,
    atento,
    a descer e a se elevar,
    supõe o mar um espreguiçamento
    do céu e o céu um êxtase do mar.


    Há nos ritmos da água
    marinha uma poesia, a mais completa,
    essa poesia universal da mágoa.


    O mar é um cérebro em laboração,
    um cérebro de poeta;
    nas suas ondas, vêm e vão
    pensamentos, de roldão.


    O mar,
    imperturbavelmente, a rolar, a rolar...
    O mar... - Concluo sempre que metido
    em sua profundeza e em sua vastidão:
    - o mar é o corpo, é a objetivação
    do espaço, do infinito.

    ««aqui»»
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